Da Ausência no Código Civil

17/06/2013 21:03

 

Introdução

 

  Inicialmente, para adentrar a questão relacionada a ausência deve-se inferir o conceito do termo. Segundo o dicionário da Língua Portuguesa, entende-se por ausente aquele em cujo estado ou circunstância não se encontra presente. Diferente se dá, no entanto,  o conceito de ausência, no âmbito do Direito. Consoante o dicionário jurídico  De Plácido e Silva,  retrata-se por ausência o indivíduo que se afasta de seu domicílio, sem deixar representante ou notícias de seu paradeiro.

 

  Trata-se, assim, de um desaparecimento sem notícias, por determinado período de tempo, o qual provoca a ação em juízo para zelar os interesses do desaparecimento. Em outras palavras, ‘‘a ausência em lugar incerto indica o afastamento da pessoa de seu domicilio sem ter deixado notícias do local em que se encontra. Nesse aspecto, ausência traz a incerteza quanto à existência da pessoa, e por essa razão provoca da lei providências no sentido de defenderem-se os próprios interesses do ausente’’.

 

 

Ausência no Código Civil

 

  Bom é relatar que no Código Civil de 1916 a parte de ausência era disciplinada pelo âmbito da capacidade, tornando o ausente uma pessoa absolutamente incapaz. Contudo, considerou-se errôneo a sua posição mediante o fato de a jurisdição proteger não os direitos do ausente, mas sim os seus bens a medida que disciplina sua sucessão.

 

  Já o código Civil de 2002 passa a tratar o ausente como capaz, mas toma medidas para a proteção de seu patrimônio, como a declaração de sucessão provisória, em que os bens do ausente são assegurados pelo herdeiro – ou curador - , com a possibilidade, ainda, do reaparecimento da pessoa, que retoma por direito os seus bens.

 

 

  Sucessão Provisória e Definitiva do Ausente

 

  Uma vez declarada a ausência  – protegendo o patrimônio do desaparecido - , leva-se à sucessão provisória ou definitiva de seus bens. Com a sucessão provisória, após transcorrido um ano da arrecadação dos bens, estabelece-se uma garantia para o caso de aparecimento do ausente, tendo o herdeiro a responsabilidade provisória de administração dos bens.

 

  Artigo relacionado: (Art. 26) Decorrido um ano da arrecadação dos bens do ausente, ou, se ele deixou representante ou procurador, em se passando três anos, poderão os interessados requerer que se declare a ausência e se abra provisoriamente a sucessão.

 

  Ademais, sobre os efeitos da sentença de abertura da sucessão provisória, estes somente se produzirão cento e oitenta dias depois de publicada a sentença; mas tão logo que passe em julgado, cria-se uma “ficção”, procedendo a abertura do testament (se houver)e ao inventário e partilha dos bens, como se o ausente fosse falecido.

 

  Somente num período de 10 anos, após julgada a sentença, os interessados poderão requerer a sucessão definitiva. Também pode requer a sucessão definitiva, o ausente que conta com 80 anos, e cujo desaparecimento declara-se por 5 anos.

 

  Vale ressaltar que regressando  o ausente no período de 10 anos, o Art. 39 do código Civil infere : ‘‘Regressando o ausente nos dez anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, ou algum de seus descendentes ou ascendentes, aquele ou estes haverão só os bens existentes no estado em que se acharem, os sub-rogados em seu lugar, ou o preço que os herdeiros e demais interessados houverem recebido pelos bens alienados depois daquele tempo’’.

 

  Em contrapartida, o retorno do indivíduo após os 10 anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, não dá direito ao mesmo sobre seu patrimônio, não podendo, assim,  ressarcir  os bens.

 

  Parágrafo único. Se, nos dez anos a que se refere este artigo, o ausente não regressar, e nenhum interessado promover a sucessão definitiva, os bens arrecadados passarão ao domínio do Município ou do Distrito Federal, se localizados nas respectivas circunscrições, incorporando-se ao domínio da União, quando situados em território federal.

 

  Como exemplo, denota-se o caso em que após um dia normal de trabalho em seu escritório, João, 40 anos, não volta para casa e não deixa representante ou procurador. Pelo exposto, correto é afirmar que a propriedade dos bens de João será definitivamente entregue aos herdeiros após o transcurso de mais de 10 anos do desaparecimento.

 

 

 Quando Cessa a Declaração de Ausência

 

  Como já relatado antes, a ausência  poderá ser cessada  com o retorno da pessoa. Mas também consiste a sua ‘‘extinção’’ a certeza da morte do desaparecido, ou a declaração de morte presumida. Nesse último caso,  a pessoa que retorna pode inquirir a declaração provando ter dado notícias de seu paradeiro, insurgindo-se quanto a data da morte provável estabelecida.

 

  A morte presumida é definida quando uma situação elege certeza quase que total da morte do indivíduo, levando (a sua morte presumida) a um caso de sucessão definitiva. Caso se faz, por exemplo,   em um cenário de acidente de avião, provocando a morte e desaparecimento de vários passageiros. Desse modo, declara-se a morte presumida do individuo desaparecido.

 

  Vale ressaltar que nesse contexto , para declarar a morte presumida, não é necessária a declaração de ausência. No entanto, uma vez sendo presumida e não concreta, caberá ao juiz estipular a data da morte presumida, levando em consideração a data de seu desaparecimento.

 

  Artigo relacionado: (Art. 7º) Pode ser declarada a morte presumida, sem decretação de ausência:

 

I - se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida;

II - se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra.

 

Parágrafo único. A declaração da morte presumida, nesses casos, somente poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do falecimento.

 

  No caso de declaração de ausência, e depois de passado um longo período de tempo, sob a falta de notícias do desaparecido, a probabilidade de o ausente ter morrido aumenta, corroborando a autorização do legislador pela premissa de sua morte, mas ainda com a possibilidade de seu retorno. Doravante, o legislador passa quase toda a proteção para os interesses dos herdeiros, ainda resguardando os direitos do ausente caso apareça. Essa é a última fase, a sucessão definitiva, quando o ausente é presumido morto.

  Segundo  a jurista Maria Berenice Dias, ‘’o ausente só é presumido morto com a abertura da sucessão definitiva. Enquanto isso, seus direitos, obrigações e sua capacidade permanecem como se vivo estivesse, inclusive “o ausente herda como qualquer outra pessoa, e a herança adquirida ingressa em seu patrimônio”.

 

  Curadoria dos Bens do Ausente

 

  No que concerne a administração dos bens, caso não tenha instituído – o ausente – um representante com poderes para cuidar de seu patrimônio, ou ainda, o aparecimento de qualquer interessado pela administração desse, cabe ao juiz declarar a ausência e nomear um curador para administrar os bens do ausente.

Artigo relacionado:   (Art. 22) Desaparecendo uma pessoa do seu domicílio sem dela haver notícia, se não houver deixado representante ou procurador a quem caiba administrar-lhe os bens, o juiz, a requerimento de qualquer interessado ou do Ministério Público, declarará a ausência, e nomear-lhe-á curador.

 

  Da mesma forma poderá representar um curador, uma vez deixando claro a recusa do representante nomeado pelo ausente,  a sua incapacidade perante a administração,  bem como a insuficiência de poderes conferidos ao representante.

Artigo relacionado:   (Art. 23) Também se declarará a ausência, e se nomeará curador, quando o ausente deixar mandatário que não queira ou não possa exercer ou continuar o mandato, ou se os seus poderes forem insuficientes.

 

  Sob o viés da curadoria, o juiz fixa os poderes e deveres do curador, determinando suas atividades, para desempenhar as funções relativas aos bens do ausente. Posto isso, nomeará o curador na ordem legal estrita e sucessiva, devendo ser substituído na falta ou numa situação de impossibilidade do anterior. A ordem sucessiva equivale a:

  • O cônjuge não separado por dois anos
  • Os pais do ausente
  • Os descendentes do ausente
  • O representante nomeado pelo juíz

  Obs: Curadoria – De acordo com o dicionário da língua portguesa, a curadoria corresponde a pessoa (curador) capacitada, que tem como objetivo chegar a um denominador comum sobre determinado assunto, pois são capacitados para tanto. No ambito jurídico, a curadoria equivale a proteção dos bens do ausente.

 

 

 A Ausência no Direito de Família

 

       Acerca da situação de ausência, ligada ao contexto do matrimônio, a ausência prolongada do indivíduo, bem como a declaração da morte presumida , não dissolve o vínculo matrimonial. O ausente, passado certo número de anos, presume-se morto; porém essa presunção não é certeza, e desse modo, para evitar a possibilidade de dois casamentos legalmente válidos, a razão exige que o cônjuge do ausente não possa contrair novo matrimônio, ainda que se presume a morte do ausente.

 

       De mesma acepção, “Por mais prolongada que seja, a ausência não tem o dom de romper o vínculo matrimonial, nem de desligar o outro cônjuge do dever de fidelidade”, assim, “a presunção da morte, no caso de ausência, produz efeitos de óbito, mas não dissolve o vínculo matrimonial”.

 

 

      Sob a perspectiva supracitada, infere-se o Art. 6º do Código, ‘‘A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura da sucessão definitiva”. Tal fator consiste a ideia de tornar possivel obter um novo matrimônio, mediante declaração de morte presumida, e por conseguinte, a sucessão definitiva.

 

     Todavia, o novo casamento não exlcui o antigo, obtido com o ausente. Se esse retorna a sua vida conjugal, apresenta-se, então, um cenário de dois casamentos válidos perante a lei, resultando num conflito jurídico das partes – revela-se, de certa forma,  uma relação de bigâmia, uma vez constando dois casamentos na norma- . Doravante, o casamento estabelecido com o ausente deverá ser dissolvido por meio do divórcio ( prevalence o último) .

 

       De acordo com a obra Direito Civil ( Parte Geral), de Oswaldo Fróes,  conflitos semlhantes sobre a ausência no matrimônio ocorrem em outros países. Na Itália, por exemplo, com o regresso do ausente, o novo casamento é nulo, sendo considerado, casamento putativo, promovendo todos os efeitos civis,; Já na França, o cônjuge pode contrair um novo casaemnto e o ausente poderá impugná-lo, pessoalmente ou através de um procurador, e caso isso ocorra será considerado nulo desde que munido de prova suficiente da existência do mesmo.