Sistemas de Hermenêutica e Aplicação do Direito- De Carlos Maximiliano
Introdução
Conceito: A hermenêutica jurídica estuda a sistematização dos métodos que exprimem as expressões e significações do Direito. É através da hermenêutica que se pode alcançar a interpretação das normas jurídicas.
- A interpretação é a aplicação da Hermenêutica . A hermenêutica, por sua vez, é a teoria científica da interpretação das leis.
Aplicação do Direito
A aplicação do Direito consiste na observação da realidade social, e a partir dela enquadrar uma norma jurídica. É, pois, um dispositivo adaptável as relações do meio, amparando juridicamente os interesses do coletivo.
Método de aplicação do Direito:
Ao analisar um caso concreto, buscando um solução, o aplicador do Direito deve considerar determinados processos. Deverá o aplicador examinar a norma quanto a sua essência e conteúdo, bem como refletir sobre as circunstancias do caso, e posteriormente, relacionar o alcance da norma a hipótese do realidade observada, promovendo assim sua adaptação.
A adaptação dessa norma pressupõe alguns requisitos, dentre eles:
Interpretação – descobrir o sentido e o alcance do texto jurídico (até onde pode ser compreendido e utilizado no caso).
Crítica – apurar a autenticidade da lei e sua constitucionalidade ( equivale a construção interpretativa da lei, que leva em consideração interpretar a norma além do seu texto isolado).
Lacunas - verificar e suprimir as lacunas do Direito, com o auxilio da analogia e dos princípios gerais do Direito.
Infere-se ,nesse sentido, que a hermenêutica serve como instrumento para a aplicação do Direito aos fatos sociais, sendo ela utilizada pelo jurisconsulto.
- A aplicação do Direito pressupõe a utilização da hermenêutica, como um medicamento pressupõe uma diagnose.
Interpretação
Conceito: Interpretar é dar significado a um conceito, reproduzindo por outras palavras um pensamento implícito no termo.
A norma é criada pelos homens, e por isso é imperfeita quanto a forma e a expressão. Deve, assim, ser sujeitada a analise interpretativa de modo determinar sua clareza e alcance do conteúdo.
Para a interpretação, caberá ao interprete promover a análise e a reconstrução. A primeira consiste a descontrução do texto jurídico, analisando cada vocábulo e seu significado. Depois, estuda-se o conteúdo do texto, comparando-o a outros dispositivos e suas implicações, de modo a descobrir qual a finalidade da inclusão da norma. Já reconstrução é a fase de síntese do texto, estabelecendo uma obra de conjunto que revela o sentido e alcance da norma.
- Interpretar uma expressão de Direito não é simplesmente tornar claro o respectivo dizer, é sobretudo, retratar o sentido apropriado para a vida real, conduzindo a uma decisão.
O hermeneuta: Cabe ao exegeta recompor o conjunto orgânico, do qual a lei oferece uma das partes. Tal conceito compreende que a norma em evidência (a norma concretizada nos textos jurídicos) não terá por si mesma a possibilidade de retratar o seu sentido mais abrangente. Assim, o hermeneuta tem como tarefa exprimir outras interpretações de que se pode valer do conteúdo normativo , para que a lei seja aplicada em diversas realidades.
- Não é possível que algumas series de normas, embora bem-feitas, sintéticas, espelhem todas as faces da realidade.
O Legislador e o aplicador do Direito: O legislador, ao determinar uma norma, não tem como prever todos os casos particulares. Desse modo, cabe a ele fixar princípios e preceitos gerais de grande alcance. O aplicador do Direito - sendo ele um juiz ou uma autoridade administrativa – ficará com a tarefa de relacionar o fato a norma jurídica, promovendo um veredito.
A interpretação, nesse contexto, é a base para a tomada da decisão, que através da Hermenêutica, consegue exprimir o significado da norma:
A palavra, quer isoladamente, quer em combinação com outra para formar a norma jurídica, ostenta apenas rigidez ilusória, exterior. É por sua natureza elástica, que varia de significação com o transcorrer do tempo... Por fora, o dizer preciso, por dentro, uma policromia de ideias.
Vontade do Legislador
Denota-se aqui a Escola da Exegese em Direito Positivo, e a Escola Histórico-Evolutiva. A Escola da Exegese possui uma corrente tradicionalista, que tinha como o objetivo da interpretação normativa revelar a vontade do legislador ( seu pensamento). Essa doutrina ensinava que o legislador criava o direito, e esse, por conseguinte , era fruto da convicção pessoal do legislador.
Todavia, a Escola História veio a desmistificar tal conjectura. Atualmente, não se interpreta mais o Direito como obra da vontade do legislador, e sim de uma elaboração da elaboração espontânea da consciência jurídica do coletivo.
A corrente histórica explica a afirmação supracitada da seguinte forma: Em primeiro lugar, a lei não emerge da vontade individual e independente do legislador, pois a própria vontade humana é condicionada por circunstâncias do meio social – cultura, política, ambiente, religião, economia -. Desse modo, todo o seu pensamento é socializado, fruto de ideias que emanam do meio em que se inserem, e não de uma vontade única e afastada do olhar social.
Segundo, porque a vontade não é o único fator que valida pensamento. Este pode ser entendido sob varias perspectivas, ilimitadas enquanto existirem no tempo e no espaço ( modifica-se o pensar de acordo com a evolução da civilização).
- O homem objetiva em uma norma o produto da consciência jurídica coletiva.
Em ultima instância, conclui-se que a ciência do Direito, como outras doutrinas, abrange um conjunto de fenômenos sociais, os quais muitos não poderiam ser previstos pelo legislador. Assim, a norma não poderia ser fruto apenas da vontade de seu ‘’criador’’, uma vez sendo aplicada a fatos que fogem da atuação de seu pensamento.
- Pode a lei ser mais sábia do que o legislador, porquanto abrange hipóteses que este não previu.
Descobrir a intenção do legislador não é de todo errôneo, pois evidencia uma parte dos elementos que integram a analise normativa. Todavia, a critica feita é a vontade não constitui seu único elemento, existindo outros de maior valia que abrangem a hermenêutica. Serve, apenas , de base ao processo histórico da formulação da lei
Sobre o brocardo In Claris Cessat Interpretatio: Difundido no âmbito jurídico, o brocardo advém de um do fenômeno de sistematização das normas e limitação da Hermenêutica, necessário numa época em que a magistratura estudava as leis de acordo com os próprios critérios pessoais de intepretação. Porém, sabe-se hoje que muito embora possa parecer disposições claras, a norma nunca é perfeita e portanto, necessita de interpretação – além da necessidade de exprimir seu sentido e alcance-.
A lei clara é aquela cujo o sentido é expresso pela letra do texto. Para saber, no entanto, se isso ocorre, é preciso procurar conhecer o sentido, ou seja, interpretar. A verificação da clareza, portanto, ao invés de dispensar a exegese, pressupõe o uso da mesma.
Sistemas de Hermenêutica e Aplicação do Direito
Denomina-se o sistema tradicional como Escolástica ou Dogmática, o qual atrela o sentido da norma a vontade do legislador. Esse sistema resultou o predomínio do método de exegese propriamente dito, o qual consistia em expor a matéria dos códigos artigo por artigo.
A Escola passa a ser substituída pela Escola Histórico-Evolutiva, que como já dito anteriormente, leva em consideração os aspectos sociais que levaram a existência da norma. Há, nesse sentido, hermeneutas que conciliam ambas as escolas, analisando tanto a vontade como o meio social com o qual se prestava o legislador.
No tocante a vertente contemporânea de interpretação , essa também equivale a outras denominações, as quais são utilizadas a determinados interesses. Denomina-se de Teleologia o processo que dirige a interpretação conforme o fim pelo qual se destina a norma ; Também é a vertente sociológica o método de aplicar o texto normativo de acordo com a necessidade social, olhando menos para o passado e mais para o futuro.
O Juiz e a Aplicação do Direito no Código Civil
Cabe aqui o motivo precípuo da finalidade da interpretação. O juiz, como aplicador do Direito, tem a obrigação de decidir sobre todos os feitos que se enquadrarem em sua jurisdição e competência, de modo que não possa se escusar de nenhum caso apresentado. Ainda que a norma seja ambígua ou omissa, deverá o juiz prover de métodos - como a analogia – que suprimem as lacunas.
Art. 4 – Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do Direito.
Amplas Atribuições do Juiz Moderno
Enquanto a lei deve regular assuntos de modo amplo, o juiz deverá estabelecer para cada relação da vida uma decisão isolada. A lei, pois, tem a função de formular preceitos gerais, de modo a serem utilizados em circunstâncias semelhantes.
Quanto mais pródiga em minúcias a lei, quanto mais particularista, maior o número de indagações que levanta, gerando instabilidade jurídica. Tal fator é resolvido com a amplitude de autoridade em face das normas, a qual é concedida ao aplicador do Direito ao interpretar a norma para adaptá-la ao caso particular.
- O magistrado não procede como insensível e frio aplicador mecânico de dispositivos; porém como órgão de aperfeiçoamento destes, intermediário entre a letra mortal dos Códigos e a vida real, apto a plasmar , com a matéria-prima da lei, uma obra útil a sociedade.
Bem como o sentido e alcance da norma, o ensino busca também ampliar o pensamento contido nela, à medida das necessidades da vida prática. Destarte, conclui-se que o magistrado é, de forma reduzida , um sociólogo, pois vigia pela observância das normas reguladoras, prevenindo e punindo as transgressões da mesma.
Ademais, o dever do juiz em adaptar o Direito a realidade é importante para reduzir a carga de disposições do legislativo. Se do contrário coubesse tão somente competencia legislativa, a reforma ou complemento de questões normativas consideradas deficientes ou de difícil interpretação, o tempo de ação da justiça se tornaria inviável, somente aumentando os litígios pendentes.