Um Movimento Pacífico e Não Anestesiado

     Em meio a tamanha repercussão vivida hoje no Brasil sobre o Movimento Passe Livre, como cidadã , não poderia me ausentar do depoimento.  Passamos, ao longo das semanas, um período a que chamo de levante. Não direi um Brasil acordado – pois a luta se manifesta há muito tempo, e dificilmente é reconhecida pelos meios comunicativos –, mas sim um Brasil que se mostra a favor de uma política ativa por meio da população.

 

    No que concerne o MPL, reivindica-se como ponto precípuo dos protestos a redução das tarifas abusivas do transporte público, indagando ainda sobre a própria existências das mesmas. De acordo com a fonte Tarifa Zero, a organização  propõe o custo do transporte público através do pagamento de impostos progressivos. Segundo o MPL:   ‘’O que a prefeitura precisa fazer é uma reforma tributária nos impostos progressivos, de modo que pague mais quem tem mais dinheiro, que pague menos quem tem menos e quem não tem não pague (impostos e taxas), ou seja, distribuir melhor o orçamento público, separando uma parte para subsidiar o transporte...’’.

 

    Todavia, a atitude dos manifestantes  para com o aumento da tarifa reflete a concepção de um país que já não permite mais a submissão – não seria, pois,  surpreendente a adesão de tantas reivindicações - . Vemos, assim, cartazes contra as tarifas, mas também contra a corrupção que gera a desigualdade. Vemos o clamor por melhores condições no transporte, bem como  na area da saúde, da educação, e nos demais setores prioritários.

 

    Inobstante, – e aqui faço a indagação que mais me preocupa -, o intenso conflito formado entre as tropas de choque e os manifestantes corroboraram a transformação brusca de onipião sobre um movimento que até então considerava-se , por vias conservadoras ,um levante ’’vergonhoso’’... Por quê? Certamente não será pela dignidade de se por em consonância com uma causa justa – já teriam o feito se fosse esse o real motivo  - .

 

    Correto ou não, o fato retrata a própria mudança de atitude frente ao movimento: A mídia declara ser ilegítima a depredação do patrimônio público e privado, de modo que o Estado não interviria nos protestos se não houvesse a ocorrência de vandalismos – sabe-se, em contrapartida, da omissão televisiva diante dos abusos de autoridade exercidos pela polícia - .

 

   E sob uma espécie de acordo não declarado , a população reage as críticas e faz jus ao protesto pacífico. Destarte, o movimento passa a ter credibilidade, correto? Talvez. Não deixemos, porém, que o  movimento pacífico se torne anestesiado!. Com a manifestação vigente, cessam as críticas sobre a legitimidade, mas também poderão cessar a preocupação do Estado perante as reivindicações. Não há violência , mas não deverá inexistir a pressão popular.

 

    Além disso, passa-se  a declarar nos protestos  a não reprodução de bandeiras de partidos , como forma de protestar contra as mazelas da representatividade política. O espetáculo, então, abre suas portas a um cenário acobertado de paradigmas entre Direita e Esquerda.

 

    Diante das repercussões supra, parece que  a grande força popular pode estar se voltando contra a si mesma: retrata-se  nas manifestações o fervor de uma grande massa que canta o hino nacional, ao lado daqueles que tentam gritar contra o ‘’facismo’’ estabelecido. Tal fator compreende que diante dos desejos aleatórios, somado a uma população culturalmente despolitizada , notória é a fragmentação ideológica dos protestos,  a qual depara-se com  a luta de um povo que exige seus direitos, ao mesmo tempo em que reprime a liberdade de expressão , esquecendo-se sobretudo  do passado da ditatura militar brasileira.   

 

    Num segundo momento, bom é de lembrar que um movimento apartidário, como se diz o MPL, não é um movimento antipartidário. A ideologia do ‘’apartidarismo’’ revela o envolvimento direto da população na reivindicação de políticas públicas, sem depender de organizações externas. No entanto, a defesa de um movimento coletivo não poderá extinguir  a colaboração de militantes de partidos políticos, considerando  o fato de que o próprio movimento se identifica com os parâmetros de uma ideologia de esquerda.

 

    E nesse sentido, também não confundiremos a ausência de bandeira política com a possibilidade de adesão a assuntos concernentes a posição direitista. O que vemos no momento é uma manifestação heterogênea, na qual teme-se o apoderamento da parte conservadora a medida em que se desvia o objetivo do manifesto as demais insatisfações do meio social.

 

    Sob esse viés,  mister se faz o maior aprofundamento dos questionamentos incitados , de modo a tornar essa anomia social  um movimento uniformizado, com propostas e finalidades claras. Pelo  o que iremos lutar? Contra o quê, e sobretudo, à quem devemos reinvindicar, são as perguntas a serem esclarecidas. Do contrário, ficaremos a mercê da descrediblidade e da piscologia reversa da ala convservadora, que nos diz: Entramos na causa! E já não se pode mais distinguir quem é quem na multidão.

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